segunda-feira, 13 de maio de 2019

QUIET RIOT - METAL HEALTH [1983]

Por Daniel Benedetti
O dia 26 de novembro de 1983 ficou marcado como a data em que, pela primeira vez na história, um álbum de uma banda de Heavy Metal chegava ao topo da Billboard 200, a principal parada de sucessos norte-americana. O feito foi conquistado por Metal Health, terceiro disco da banda Quiet Riot.
A história de como Metal Health surgiu é envolvida em drama (e uma dose de acaso), sendo curiosa de se acompanhar.
O Quiet Riot foi fundado pelo guitarrista Randy Rhoads e pelo baixista Kelly Garni, na cidade norte-americana de Los Angeles, em 1973. Completavam a banda o vocalista Kevin DuBrow e o baterista Drew Forsyth. Em meados da década de 1970, o Quiet Riot havia se firmado como um dos nomes mais conhecidos da cena “underground” de Los Angeles, tendo sido banda de abertura diversas vezes para o Van Halen nos clubes noturnos da cidade. Após anos de trabalho intenso, em 1977, o grupo finalmente conseguiu um acordo com uma gravadora, a Sony Records, mas o contrato previa o lançamento de 2 álbuns apenas no Japão. A estréia, Quiet Riot, foi lançada em 1977 e Quiet Riot II, em 1978.
A esta altura, tensões especialmente entre o vocalista Kevin DuBrow e o baixista Kelly Garni estavam atingido níveis insuportáveis, resultando com a saída de Garni do conjunto, tanto que o baixista, apesar de ter tocado, não foi creditado em Quiet Riot II. Rudy Sarzo foi o substituto de Kelly, sendo creditado e fotografado como baixista da banda no disco, embora tenha entrado no grupo após a conclusão da gravação. Em 1979, a chamada “pá de cal” aconteceu para esta formação do Quiet Riot. Após o último show da turnê do grupo, em setembro, o guitarrista Randy Rhoads aceitou um convite para uma audição, em um estúdio de Los Angeles, para a nova banda de Ozzy Osbourne, o qual, na época, havia acabado de deixar o Black Sabbath.
Kevin DuBrow of Quiet Riot performs on the TV show “Solid Gold” Los Angeles, California. (Photo by Ron Wolfson/WireImage)
Bem, o resto é de conhecimento geral.
A saída de Rhoads encerrou as atividades do Quiet Riot. DuBrow e Forsyth seguiram em frente com a adição do guitarrista Greg Leon e o ex-baixista do grupo Suite 19, Gary Van Dyke. Durante o período entre os anos de 1980 e 1982, a banda mudou seu nome para ‘DuBrow’ e também fez shows com o ex-baterista do grupo Gamma, Skip Gillette. No início de 1982, Kevin DuBrow telefonou para Rhoads, pedindo sua permissão para retornar a usar o nome Quiet Riot, em uma busca por uma nova formação do grupo, que incluiria o guitarrista Carlos Cavazo e o baterista Frankie Banali. Randy não viu objeções.
Entretanto, aos 25 anos de idade, tragicamente, Randy Rhoads faleceu no dia 19 de março de 1982, em Leesburg, na Flórida, em um acidente com uma aeronave do modelo Beechcraft F35.
Algum tempo depois, DuBrow telefonou para Rudy Sarzo convidando-o para gravar a faixa “Thunderbird”, uma homenagem a Randy, com o grupo. Sarzo havia deixado a banda de Ozzy Osbourne há pouco tempo, alegando dificuldades em lidar com a perda do amigo e companheiro de grupo. DuBrow, Sarzo, Cavazo e Banali se divertiram bastante gravando a canção em homenagem ao falecido amigo e, aquilo que seria apenas uma faixa, acabou se tornando metade de um álbum. Sarzo, então, retornou como baixista definitivamente ao grupo, o qual estava em dúvidas em usar o nome Quiet Riot. Foi a mãe de Randy, Dolores, quem deu o aval para que seguissem com a denominação original da banda. O renomado produtor Spencer Proffer auxiliou o Quiet Riot a conseguir um contrato com a CBS Records para o lançamento de um álbum. O próprio Spencer realizaria a produção do disco, no The Pasha Music House, em Hollywood, onde as gravações ocorreriam, ainda em 1982.
Metal Health viria ao mundo em 11 de março de 1983.
“Metal Health (Bang Your Head)” abre o disco com peso e agressividade na dose perfeita, muito graças a um ótimo riff e um refrão empolgante. Um verdadeiro símbolo do Hard Rock dos anos 80. A versão do Quiet Riot para” Cum On Feel the Noize”, clássico do Slade, é repleta de um ritmo contagiante, um ar ‘cinquentista’ e se tornou o maior sucesso do grupo, contando com ótimos vocais de DuBrow e um inspirado solo do guitarrista Carlos Cavazo.
“Don’t Wanna Let You Go” quebra um pouco do ritmo inicial, tendo um ritmo mais suave, lento e cadenciado, abusando do groove, com Kevin DuBrow cantando de maneira um tanto quanto mais contida. “Slick Black Cadillac” é uma regravação de uma canção do próprio Quiet Riot lançada em 1978, no seu segundo álbum de estúdio, o QR II. Possui riff bem pesado e rápido, lembrando o Van Halen setentista. O andamento arrastado da ‘Power Ballad’ chamada Love’s a Bitch é incrementado por bons vocais de DuBrow. “Breathless” é um típico Glam Metal oitentista, com um riff interessante. Run for Cover é bem mais agressiva e flerta bastante com o Heavy Metal tradicional, contando com um bom trabalho de Cavazo. “Battle Axe” é um pequeno solo do próprio Cavazo.
A empolgante “Let’s Get Crazy” parece retirada de um dos melhores momentos de “Fly on the Wall”, do AC/DC (o qual foi lançado 2 anos depois, diga-se). Por fim, “Thunderbird” se apresenta com sonoridade suave, embasada por uma lindíssima melodia, tornando-se uma tocante canção. Os vocais de DuBrow estão mais sutis e se casam de maneira belíssima com o ritmo da música.
“Metal Health (Bang Your Head)” até fez algum barulho em termos de paradas de sucesso, mas foi a matadora versão para “Cum On Feel the Noize” quem alavancou o álbum para o topo da Billboard 200. Os videoclipes gravados para ambas também tiveram intensa circulação na MTV dos Estados Unidos. O single “Cum On Feel the Noize” chegou ao 5º lugar da Billboard Hot 100 em novembro de 1983, auxiliando a Metal Health desbancar Synchronicity, do The Police, do topo da principal parada norte-americana de discos.
Quiet Riot 1983 Rudy Sarzo, Kevin DuBrow, Frankie Banali, Carlos Cavazo (Photo by Chris Walter/WireImage)
Metal Health é um álbum símbolo da época em que foi concebido, ponto mais alto da carreira do Quiet Riot, e um dos principais discos do chamado Glam Metal. Para fãs deste tipo de sonoridade – caso deste escriba – é um item especial, mas que, contudo, pode soar extremamente datado para o restante dos ouvintes.
Portanto, Metal Health foi um tremendo sucesso comercial e supera a casa de 6 milhões de cópias vendidas apenas nos Estados Unidos. Além disso, o álbum foi fundamental na divulgação da cena Glam Metal de Los Angeles, auxiliando na promoção de outras bandas como Mötley Crüe, Ratt e W.A.S.P., por exemplo.
Também é verdade que o Quiet Riot jamais chegou a sequer emular algo que pudesse repetir o sucesso (e a qualidade) de Metal Health. Condition Critical [1984], lançado no ano seguinte, até vendeu bem, mas depois disso, nunca mais a banda foi a mesma.
Tracklist:
  1. Metal Health (Bang Your Head)
  2. Cum On Feel the Noize
  3. Don’t Wanna Let You Go
  4. Slick Black Cadillac
  5. Love’s a Bitch
  6. Breathless
  7. Run for Cover
  8. Battle Axe
  9. Let’s Get Crazy
  10. Thunderbird

segunda-feira, 6 de maio de 2019

Creedence Clearwater Revival – Fortunate Son [1969]

Por Daniel Benedetti
“Fortunate Son” é uma canção da banda norte-americana Creedence Clearwater Revival, presente em seu 4º álbum de estúdio, Willy and the Poor Boys, lançado em 2 de novembro de 1969. A música foi composta pelo líder e coração do grupo, o vocalista e guitarrista John Fogerty, e bem rapidamente assumiu o caráter de “Hino Antiguerra” e se tornou uma forte expressão do movimento da Contracultura em oposição ao envolvimento norte-americano na Guerra do Vietnã.
A Guerra do Vietnã (ou segunda Guerra da Indochina, ou ainda Guerra de Resistência contra a América) foi um conflito armado que se deu no sudeste asiático (Vietnã, Laos e Camboja), entre o Vietnã do Norte e o Vietnã do Sul, de 1º de novembro de 1955 a 30 de abril de 1975.
Uma das características principais deste conflito, ocorrido no auge da chamada Guerra Fria, foi que o Vietnã do Norte era apoiado pelos países comunistas (União Soviética, China, etc.) enquanto o Vietnã do Sul era apoiado por países anticomunistas, em especial, os Estados Unidos.
A presença norte-americana na guerra foi intensificada a partir de 1965 após, no ano anterior, o navio contratorpedeiro USS Maddox ter sido supostamente atacado pelos norte-vietnamitas. Estima-se que mais de 2 milhões de soldados norte-americanos participaram da guerra.
Paralelamente, e como foi citado acima, a chamada Contracultura da década de 1960 foi um fenômeno cultural anti-establishment que se desenvolveu primeiro no Reino Unido e depois nos Estados Unidos, antes de se espalhar por grande parte do mundo ocidental entre meados dos anos 1960 e meados da década de 1970.
O movimento ganhou impulso à medida que o Movimento dos Direitos Civis (Estados Unidos) continuou a crescer e se tornaria mais tarde revolucionário com a expansão da extensa intervenção militar do governo dos EUA no Vietnã. Com o progresso da década de 1960, tensões sociais generalizadas também se desenvolveram em relação a outras questões e tenderam a fluir segundo linhas geracionais relativas à sexualidade humana, direitos das mulheres, modos tradicionais de autoridade, experimentação com drogas psicoativas e diferentes interpretações do chamado “Sonho Americano”.
Foi neste complexo caldeirão político econômico-social em que “Fortunate Son” foi composta. Em Willy and the Poor Boys, além do supracitado John Fogerty, o Creedence Clearwater Revival era composto pelo guitarrista Tom Fogerty (irmão de John), pelo baixista Stu Cook e pelo baterista Doug Clifford.
A bateria de Clifford é essencial na rápida introdução da canção, criando um clima de expectativa. O riff principal é excelente, em um Hard Blues Rock primoroso, embalado por vocais bem agressivos de John. A letra, inteligentemente, contrapõe o nacionalismo inflamado no cidadão em oposição à forma como o estado o usa:
Some folks are born
Made to wave the flag
Ooh, they’re red, whit and blue
And when the band plays Hail To The Chief
They point the cannon right at you
O refrão é incrível e sua letra é autoexplicativa:
It ain’t me
It ain’t me
I ain’t no millionaire’s son
It ain’t me
It ain’t me
I ain’t no fortunate one
De acordo com seu livro de memórias, lançado em 2015, John Fogerty estava pensando em David Eisenhower, neto do presidente Dwight D. Eisenhower, que se casou com Julie Nixon, filha do então presidente eleito Richard Nixon em 1968, quando escreveu a canção:
“Fortunate Son não foi realmente inspirada por nenhum evento. Julie Nixon estava namorando David Eisenhower. Você ouviria sobre o filho deste senador ou aquele congressista que recebeu um adiamento das forças armadas ou uma posição de escolha nas forças armadas. Eles pareciam privilegiados e, querendo ou não, essas pessoas eram simbólicas no sentido de que não estavam sendo tocadas pelo que seus pais estavam fazendo. Eles não estavam sendo afetados como o resto de nós”. (presente no livro Fortunate Son: My Life, My Music).
Helicópteros norte-americanos no Vietnã.
Na próxima estrofe, a crítica sutil contra o egoísmo e o excesso de individualismo é nítida ao se contrapor a riqueza (Silver spoon in hand / Lord don’t they help themselves) às atitudes mesquinhas (Lord, the house looks like a rummage sale):
Some folks are born
Silver spoon in hand
Lord don’t they help themselves
But when the tax man comes to the door
Lord, the house looks like a rummage sale
Na segunda vez em que se repete o refrão, a letra sofre uma pequena variação, com John trocando senator’s son por millionaire’s son.
Na terceira estrofe, a letra reflete sobre quem são as pessoas que são enviadas para a guerra:
Some folks inherit
Star spangled eyes
Ooh, they send you down to war
And when you ask them
How much should we give?
They only answer: More! More! More!
A faixa termina com o refrão sendo repetido em “fade out”:
It ain’t me
It ain’t me
I ain’t no military son
It ain’t me
It ain’t me
I ain’t no fortunate one
It ain’t me
It ain’t me
I ain’t no fortunate son
De modo geral, uma boa interpretação para “Fortunate Son” é o sentimento de injustiça, ou seja, somente os desafortunados seriam enviados para uma guerra que eles mesmo não causaram.
“Fortunate Son” havia sido lançada como single (junto a “Down on the Corner”), antes mesmo do álbum Willy and the Poor Boys, em setembro de 1969. Ela alcançaria a 3ª posição da principal parada norte-americana desta natureza. Em 2014, a revista norte-americana Rolling Stone a colocaria na 99ª posição de sua lista 500 Greatest Songs of All Time. O single vendeu mais de 2 milhões de cópias somente nos Estados Unidos.
A Guerra do Vietnã terminou em 30 de abril de 1975, com a vitória do Vietnã do Norte e a unificação do país em um único, com a queda da cidade de Saigon. Entre diversos horrores e atrocidades, cometidos por ambos os lados, estimam-se que houve de 1,5 a 2 milhões de vietnamitas mortos. As baixas norte-americanas ficam em 58 mil mortos e mais de 300 mil feridos. Uma carnificina.
Portanto, “Fortunate Son” se transformou em um emblema antiguerra a partir de então, sendo, ademais, um dos maiores clássicos do Creedence Clearwater Revival.